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Rio, 5 de setembro de 2014              

“Voltar ao Brasil foi como retornar a uma prisão”

 Essa afirmação contundente reflete o sentimento vivido por milhares de cadeirantes em nosso país, que experimentam no dia a dia um total desrespeito às regras básicas de acessibildade. O IBDD reproduz abaixo a entrevista que Michele Simões, designer de moda, deu a O Globo no dia 2 de setembro.

“Tenho 32 anos, sou designer de moda e sempre sonhei em fazer intercâmbios. Aos 24 anos, um acidente de carro me deixou paraplégica. Apesar das dificuldades que passei a ter, nunca desisti de estudar fora. No ano passado, realizei finalmente o meu sonho e viajei para os Estados Unidos”

Michele Simões: Grande parte das pessoas ainda acha que cadeirantes não saem de casa e, muito menos, viajam. Quando decidi fazer meu primeiro intercâmbio em Boston, no ano passado, percebi que até os serviços de viagem, de maneira geral, não estavam preparados para me atender. Foi dessa dificuldade para encontrar referências e serviços que o blog Guia do Viajante Cadeirante nasceu. Para minha surpresa, descobri que eu não era a única que tinha vontade de conhecer o mundo sentada numa cadeira de rodas.

Qual seu principal objetivo com o blog?
MS: A proposta é mostrar que é totalmente possível fazer atividades e realizar desejos quando há acessibilidade. Criei o blog uma semana antes de minha viagem para Boston e convidei as pessoas a me seguirem. Todas as conquistas e frustrações vividas nos Estados Unidos foram postadas no blog. Ou seja, mostrando o que era viável ou não para um cadeirante naquela cidade.

O blog, que existe há apenas um ano, já tem muitos seguidores?
MS: São 1.160 seguidores.

Entre as cidades que já visitou, qual oferece melhor mobilidade para um cadeirante?
MS: No Brasil, infelizmente, ainda não consegui me aventurar muito, pela falta de acessibilidade. Quando estive nos Estados Unidos, morei em Woburn, cidade vizinha a Boston, que parecia cenográfica, de tão limpa e acessível. Essa mesma boa impressão tive na Filadélfia. Nova York, que achei que seria um exemplo a ser seguido, foi uma decepção, pois não consegui me virar sozinha lá. Além disso, as pessoas não são muito hospitaleiras. Portanto, não indicaria a um cadeirante que não tenha muitas habilidades na cadeira, como eu, ir sem acompanhante para lá.

Como é para um cadeirante viver no Brasil?
MS: Após a viagem para Boston, voltar ao Brasil foi como retornar a uma prisão. Em Boston, voltei a me sentir independente: pegava ônibus, metrô, andava com meus amigos pelas ruas sem precisar pedir ajuda. Pequenas coisas que me fizeram enxergar a deficiência de maneira completamente diferente. Num lugar acessível, os deficientes transitam mais pelas ruas, as pessoas convivem com essas diferenças sem achar estranho ou sentir pena. No período em que estive por lá, visitei um grande hospital de reabilitação, uma ONG e um escritório de arquitetura especializado em acessibilidade. É impressionante o cuidado que a cidade tem com seus cidadãos.

Alguma cidade brasileira tem boas condições para um cadeirante?
MS: Escrevo muito sobre São Paulo. Procuro lugares que sejam acessíveis, mas não posso dizer que haja ótimas condições de acessibilidade. Na semana passada, fiz um trajeto para pegar ônibus e metrô. O que encontrei: ruas esburacadas, calçadas desniveladas, rampas impossíveis de serem usadas, falta de informação por parte dos funcionários dos coletivos, além de dois elevadores quebrados no metrô.

Quando e para onde será sua próxima viagem?
MS: Meu próximo destino será Montreal, no Canadá. Embarcarei em outubro, sozinha, com o propósito de desbravar a cidade e mostrar o que é e o que não é acessível por lá.

 

Michelle simões

Michelle Simões - Foto Michel Filho / Agência O Globo.

 
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